Por Almir Pereira Borges
Júnior
O
consumidor é atraído a supermercados e lojas com o intuito de comprar produtos
para sua subsistência ou para saciar sua vontade de consumo.
Ao
ser atraído pelo estabelecimento comercial, independentemente do motivo, o
consumidor nem sempre está preparado e nem sequer é informado sobre as práticas
adotadas pelos fornecedores de produtos.
Atualmente,
os fornecedores de produtos adotam a prática de lacrar sacolas, bolsas ou
mochilas. Ao adentrar o estabelecimento comercial o consumidor é surpreendido
com a ação ostensiva do uso do lacre, sem qualquer possibilidade de discutir se
tem interesse ou não nessa “prestação de serviço”, ou seja, se quiser entrar,
tem que lacrar.
A
prática é mais comum em grandes lojas e redes de supermercados, a intenção é
prevenir furtos e o consequente prejuízo financeiro à empresa. Justa e válida a
intenção do empresário em não ter prejuízo por conta da ação de criminosos, mas
todos consumidores devem realmente sofrer diretamente as consequências pela
prática delituosa de alguns indivíduos?
A
resposta para essa pergunta e para outras a respeito do tema pode estar pronta
e ser de fácil compreensão, mas necessita de uma análise mais apurada sobre o
assunto para se chegar a uma solução que mais se aproxime do bem comum.
O
Código de Defesa do Consumidor não possui disposição específica sobre a prática
dos estabelecimentos comerciais de utilizarem o lacre nos pertences dos
consumidores, disponibilizar guarda-volumes para mantê-los ou ter ciência do
conteúdo deles, embora adotem tal prática.
O intuito
do fornecedor é obrigar o consumidor a agir como ele deseja, porém a análise
necessita ir além das disposições do código para chegarmos a um consenso.
A
Constituição Federal dispõe que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer
algo senão por força de lei (artigo 5º, inciso II), ou seja, da mesma forma que
não há disposição no Código de Defesa do consumidor sobre a proibição do uso do
lacre, também não há norma que trata sobre a necessidade do estabelecimento
comercial obrigar o consumidor a ter seus pertences lacrados, revistados ou
depositados no guarda-volumes por medidas de segurança do fornecedor.
Ressalta-se
que os direitos dos consumidores podem ser disciplinados de forma concorrente
pela União, Estados e Distrito Federal (artigo 24, inciso V e VIII da
Constituição Federal), portanto, a falta de lei federal legitima a competência
de Estados e Distrito Federal para legislar sobre a matéria.
Frise-se
que o Estado de São Paulo ainda não possui legislação sobre a necessidade do
lacre, mas para efeito de comparação, o Estado do Rio de Janeiro já possui
norma sobre o assunto, qual seja, a Lei 5.161/07[1]. A referida lei prescreve
a proibição do uso do lacre em bolsas e sacolas de consumidores ao adentrar
estabelecimento comercial.
O
PROCON de São Paulo emitiu esclarecimento, por meio de sua assessoria de
imprensa em 21/02/2011, que o uso do lacre não é ofensivo, desde que haja a
divulgação ostensiva da prática de tal medida pelo estabelecimento comercial[2], pois atenderia ao
princípio da informação (artigo 6º, inciso III do Código de Defesa do
Consumidor).
Como
abordamos anteriormente, não há lei federal e no Estado de São Paulo sobre o
uso do lacre por estabelecimentos comerciais, contudo, se houvesse legislação e
ela obrigasse o consumidor a lacrar sua sacola ou bolsa, pode-se entender que
ela seria inconstitucional.
Norma
que obriga o consumidor a ser constrangido a lacrar sua sacola ou bolsa pelo
fato do estabelecimento comercial não possuir controle sobre a sua própria
segurança, fere o princípio fundamental da presunção de inocência (artigo 5º,
inciso LVII da Constituição Federal), pois a culpa pelos furtos de produtos
ocorridos dentro do estabelecimento comercial acarretaria na responsabilização
indireta do consumidor.
A
bem da verdade, a prática do lacre é uma tentativa frustrada dos
estabelecimentos comerciais de evitarem os furtos de produtos e dano ao seu
patrimônio (teoria do risco da atividade), cujo uso deveria ser ponderado, pois
existem medidas mais eficazes para evitar esse tipo de delito como, por exemplo,
câmeras de segurança e tarja eletrônica.
Além
disso, o uso do lacre pode ter caráter discriminatório, pois o fornecedor pode
determinar quais consumidores terão seus pertences lacrados, podendo influir na
prática do seu ato discricionário o sexo, a raça ou a classe social do
consumidor.
O
uso de outros métodos contra os furtos se torna mais efetivo e o custo para
implantação e manutenção pode ser absorvido pelo fornecedor, pois são medidas
que podem diminuir sensivelmente ou cessar os furtos de produtos dentro de suas
dependências. A utilização de métodos menos invasivos estaria de acordo com as
diretrizes básicas de proteção e defesa do consumidor.
É
perceptível que o conflito de interesses entre lacrar sacolas pelo fornecedor
como medida de segurança e o constrangimento do consumidor em ser punido com o
lacre de seus pertences logo ao adentrar o estabelecimento comercial, deve ser
resolvido com a devida proteção e defesa do consumidor, ou seja, a abolição do
lacre ou seu uso a pedido do consumidor, assim como o livre trânsito do
consumidor sem qualquer discriminação ou constrangimento.
[1] Assembleia
Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Lei 5.161/07 proíbe que os
estabelecimentos comerciais lacrem sacolas de compras dos consumidores que
visitam as lojas, e dá outras providências, 11/12/2007. Disponível em: <http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/contlei.nsf/f25edae7e64db53b032564fe005262ef/5d906de329176a5c832573b1005d6c56?OpenDocument&Highlight=0,5161>
Acesso em: 04 de setembro de 2013.
[2] Fundação
de Proteção e Defesa do Consumidor - PROCON/SP, 21/02/2011. Lacre em Sacolas de
Clientes. Disponível em: <http://www.procon.sp.gov.br/noticia.asp?id=1886> Acesso em: 04 de setembro de 2013.
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